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segunda-feira, 13 de junho de 2022

ESPOROTRICOSE

 A esporotricose, também conhecida como doença do jardineiro, é provocada por mais de uma espécie de fungo do gênero  Sporothrix , encontrado no solo e em plantas e de distribuição mundial, sendo muito comum no Rio de Janeiro, com número ascendente de casos na última década. 

A doença é mais comum em gatos mas também pode acometer outras espécies. Por ser transmissível ao homem é considerada um zoonose.

No Rio de Janeiro, o Hospital Evandro Chagas (Fiocruz) é considerado como referência para o tratamento da doença em seres humanos.

De acordo com a Agência Fiocruz de notícias, a maioria dos casos, no Rio de Janeiro, em seres humanos é oriunda de arranhões e mordeduras de felinos doentes.

A forma natural de contágio é por penetração de estruturas miceliais através de um ferimento. O fungo multiplica-se no nódulo linfático, onde fica retido, quando alcança um número elevado se espalha pelos vasos linfáticos. A doença é crônica e tem desenvolvimento lento.

Em humanos, observa-se a forma pápulo-nodular eritematosa que evolui para ferimentos ulcerados ou lesões verrucosas. Um linfangite nodular ascendente também pode ser observada. O período de incubação pode variar de alguns dias até 3 meses. As lesões são mais frequentes nos membros superiores e na face.
A forma cutânea da doença é a mais comum e pode se apresentar de 3 formas:
- forma cutânea localizada - com ferimentos superficiais sem comprometimento linfático
- forma cutâneo linfática  - é a forma mais comum. A lesão começa com a formação de um nódulo que ulcera. A partir desta lesão forma-se um cordão endurecido que segue pelos vasos linfáticos em direção os linfonodos.
- forma cutâneo disseminada - ocorre em paciente s imunossuprimidos. Lesões nodulares, ulceradas e verrucosas se disseminam pela pele.



Em felinos a forma cutânea da doença é a mais observada. As lesões são mais frequentes na região da cabeça. A forma extracutânea pode comprometer diversas áreas do organismo, com envolvimento dos pulmões, articulações, seios nasais ou sistema nervoso central. Sintomatologia respiratória (espirros, dispneia e secreção nasal), assim como linfangite e linfadenomegalia podem também ser observados. 



O diagnóstico definitivo requer isolamento do fungo em meio de cultura e posterior identificação, o que pode levar de quinze a vinte dias. Os exames de citopatologia e histopatologia são uma alternativa viável, com alto grau de confiabilidade e muito mais rápido permitindo que o animal não precise ficar tanto tempo aguardando para iniciar o tratamento. 
 





segunda-feira, 9 de novembro de 2020

O VÍRUS RÁBICO (LYSSAVIRUS) E OS MORCEGOS (MAMMALIA, CHIROPTERA):UMA BREVE REVISÃO


 

por Dra Márcia Baptista 

A raiva é causada por um vírus (gênero Lyssavirus, Família Rhabdoviridae) e é considerada uma das mais antigas zoonoses já descritas, tendo seus primeiros relatos no antigo Egito em 2300 a.C. e na Grécia Antiga por Aristóteles. Apesar de sua alta letalidade, o vírus rábico é bastante lábil e facilmente destruído quando fora do organismo. A contaminação normalmente ocorre através da pele lesionada em contato com a saliva de um animal doente. A transmissão por aerossóis pode ocorrer mas é muito rara e depende de uma população de vírus e de hospedeiros potenciais elevadas (Brass, 1994).


Diphylla ecaudata 

No Brasil temos 03 espécies de morcegos hematófagos: Desmodus rotundus (E. Geoffroy, 1810), Diphylla ecaudata (Spix, 1823) e Diaemus youngii (Jentink, 1893). Destes, D. rotundus constitui a forma mais abundante e mais generalista quanto ao tipo de presa, predando aves, répteis e mamíferos. As demais espécies, D ecaudata e D. youngi alimentam-se, em condições naturais, preferencialmente, do sangue de aves.

D. rotundus é um morcego de porte médio que vivem em colônias formadas por haréns ou por machos solteiros. Apresentam estrutura social complexa entre indiduos da mesma colônia, seguem alguns exemplos:

- reciprocidade na higiene entre as fêmeas, que lambem umas as outras e se ajudam na retirada de ectoparasitas e sujidades que estejam grudadas na pelagem. O mesmo cuidado é direcionado ao macho responsável pela colônia, aos filhotes e jovens.

-Divisão de alimento através de regurgitação com outros membros da colônia.

Os filhotes ficam separados em um berçário e sempre sob a supervisão de um adulto.

O morcego vampiro comum, D. rotundus, possui em sua saliva uma glicoproteína (inibidor do fato X) denominada “draculina”, e um ativador de plaminogênio (Desmodus Sallivary Plasminogen Activator), ambas com ação anticoagulante. Tal característica facilita sua alimentação pois o sangue da presa permanecerá escorrendo do ferimento por mais tempo. O estudo destas substâncias tem demonstrado várias aplicações no tratamento de doenças cardíacas e vasculares.

Os morcegos hematófagos são extremamente relevantes do ponto de vista sanitário e também econômico, pois podem acarretar perdas às criações de herbívoros, propiciadas pela hipovolemia decorrente das sucessivas mordeduras, pela infestação de larvas de mosca nas feridas, miíase, e pela mortalidade provocada pelo vírus rábico. Na América Tropical D. rotundus é considerado como o principal transmissor do vírus rábico

Nos últimos séculos com aumento da urbanização e a destruição descontrolada da Mata Atlântica associada à criação de grandes animais para abate, o homem involuntariamente fez com que o morcego vampiro se aproximasse mais das cidades. Vacas, cavalos, galinhas se tornaram uma fonte fácil e farta para uma espécie que antes precisava se contentar com pequenos animais silvestres nativos da região. A consequência disso foi um boom na população de morcegos hematófagos. Aos poucos, todavia, muitas áreas de fazenda foram substituídas por grandes cidades e a perda brusca da fonte de alimento fez com que fosse necessário encontrar novos tipos de presas.

Um levantamento detalhado dos casos de raiva em humanos no Brasil no período entre 1990 e 2017 é descrito por Vargas et al (2019). De acordo com os autores existem 594 casos oficialmente comprovados, a maioria em área rural. Entre 2009 e 2017 houveram 27 casos, dos quais 11 foram transmitidos por cães, 08 por morcegos, 04 por macacos e 03 por gatos.

Apesar das inúmeras campanhas de conscientização muitas pessoas ainda se mostram resistentes ou imprudentes e não vacinam anualmente seus animais. A vacina antirrábica deve ser realizada, por médico veterinário, não somente em cães e gatos mas também em equinos e ruminantes, e realizado reforço anual.

Para seres humanos a vacina antirrábica é indicada em duas situações de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS):

- pré-exposição - indicada para pessoas que trabalham em profissões de alto risco (veterinários, pesquisadores que trabalhem com animais silvestres, ou que fiquem expostos em locais onde haja risco de contaminação); moradores de regiões onde há alta incidência da doença; pessoas que irão viajar para locais muito isolados ou com risco de contágio.

- pós-exposição – indicada para pessoas após terem sido atacadas por animal suspeito para prevenir o desenvolvimento dos sintomas clínicos.


Na cidade de Niterói, Rio de Janeiro, nos últimos anos, tem havido relatos de ataques de morcegos hematófagos a cães.

Na cidade de Niterói, Rio de Janeiro, nos últimos anos, tem-se tido relatos de ataques de morcegos hematófagos a cães. Em 29 de junho do corrente ano, um cão macho da raça dálmata de 07 anos foi atendido pela M.V. Flávia C. R. Nascimento, no bairro Peixoto, Itaipu, apresentando um ferimento oval na pata anterior direita, compatível com lesão ocasionada por morcegos hematófagos. A suspeita foi confirmada através da câmera de segurança da residência. O incidente foi notificado e devidamente registrado no centro de controle de zoonoses de Niterói, RJ.


Pesquisas recentes revelam que apesar de não serem muito frequentes os casos de raiva em cães, o vírus ainda mata animais silvestres no estado do Rio de Janeiro. A doença existe e a única forma de conseguirmos não retroceder no tempo com um crescimento no número de casos no país, não apenas em cães e gatos mas também em humanos, é através da prevenção.

Devemos ter em mente que qualquer mamífero é capaz de se contaminar e transmitir o Lyssavirus. Portanto é de grande importância ressaltar que matar indiscriminadamente animais silvestres, como por exemplo, micos e gambás, não irá solucionar o problema. Pelo contrário, a falta de presas irá fazer com que cada vez mais os morcegos hematófagos precisem procurar alimento nos centros urbanos. Bernardes-Filho et al (2014) descreve um caso de um homem de 42 anos que sofreu múltiplos ataques por Desmodus rotundus também na cidade de Niterói.

Da mesma forma, matar morcegos aleatoriamente também não resolverá o problema e ainda causará um desequilíbrio ecológico no ecossistema da região pois das mais de 70 espécies existentes somente uma se alimenta do sangue de mamíferos. As demais espécies se alimentam de néctar, frutas e insetos e auxiliam inclusive no controle de mosquitos e outros insetos de uma região.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


BERNARDES-FILHO, F.
Et al. 2014. Multiples lesions by vampire bat bites in a patiente in Niterói, Brasil, Case Report. An. Bra. Dermatol. 89(2):340-343.

KAKUMANU, R. et al. 2019.Vampire Venom: Vasodilatory Mechanisms of Vampire Bat (Desmodus rotundus) Blood Feeding. Toxins (Basel). 11(1): 26.

PERACCHI, A & NOGUEIRA, M. 2010. Lista anotada dos morcegos do Estado do Rio de Janeiro, sudeste do Brasil. Chiroptera Neotropical, 16.

SANTOS, Hertz. 1998. Estudo de uma colônia de morcegos hematófagos, Desmodus rotundus (PHYLLOSTOMIDAE, DESMODONTINAE), na Fazenda Santa Carlota, Município de Cajuru, São Paulo.. Universidade de São Paulo, Disssertação de Mestrado em Zoologia.

SODRÉ, M. M. et al. 2010. Update list of bat species positive for rabies in Brazil. Rev. Inst. Med. Trop. São Paulo, 52(2):75-81.

VARGAS et al. 2019. Human Rabies in Brazil: a descriptive study, 2000-2017. Epiodemiol. Serv. Saude. 28(2)

WILKINSON G.S. 1984. Reciprocal food sharing in vampire bats. Nature 309:181–184

WORLD HEALTH ORGANIZATION https://www.who.int/ith/vaccines/rabies/en/